“O direito nós já temos, queremos respeito”: a caminhada afrorreligiosa do Engenho Velho da Federação – Salvador - Ba

Abstract

A Caminhada pelo Fim da Violência e do Ódio Religioso, pela Paz, é uma manifestação pública de terreiros de candomblé do Engenho Velho da Federação, bairro popular de Salvador, de população predominantemente negra. Organizada desde 2004, a partir da iniciativa de lideranças religiosas locais, foi motivada por agressões e ofensas de igrejas neopentecostais instaladas no bairro, a partir da década de 1990, em meio a uma ostensiva hostilidade contra religiões afro-brasileiras, empreendida por novas vertentes e igrejas do campo pentecostal no Brasil contemporâneo. Com base em trabalho de campo, através da observação participante e de entrevistas, sobretudo com organizadores da Caminhada, a pesquisa buscou identificar modos de organização e estratégias adotados por religiosos afro-brasileiros para a realização da manifestação e analisar a Caminhada do Engenho Velho como uma ação coletiva de caráter expressivo, um ritual ou ato performativo. A pesquisa procurou também situar o surgimento da manifestação a partir da mobilização de comunidades religiosas afro-brasileiras em Salvador, para o enfrentamento dos conflitos inter-religiosos, e apresentar uma abordagem histórica da ocupação da área da cidade onde se localiza o bairro, sua inserção no espaço urbano de Salvador, de modo a discutir interconexões entre a dimensão territorial, religião e identidade negra, através das quais o povo de candomblé se apresenta no espaço público como um sujeito político coletivo. Para sair às ruas, seus agentes promovem a interlocução e cooperação entre diversas comunidades religiosas do bairro e do seu entorno. Na manifestação, eles acionam concepções cosmológicas e elementos rituais que se associam à proclamação da importância dos terreiros na vida local, de relações entre esses terreiros do bairro e tantos outros existentes na cidade e no Brasil, bem como articulam identidade religiosa e étnico-racial para prosseguir na luta contra o ódio religioso.

The Peace March Against Violence and Religious Hatred is a public manifestation of candomblé´s temples in Engenho Velho da Federação, a popular neighbourhood in Salvador, with a predominantly black population. Organized since 2004, from the initiative of local religious leaders, it was motivated by aggressions and offenses from Neo-Pentecostal churches installed in the neighbourhood, from the 1990s, amidst an ostensible hostility against afro-brazilian religions, undertaken by new trends and churches of the Pentecostal domain in contemporary Brazil. Based on fieldwork, through participant observation and interviews, especially with the Peace March´s organizers, the research sought to identify modes of organization and strategies adopted by afro-brazilian religious to carry out the demonstration and analyse the March of Engenho Velho as a collective action of expressive character, a ritual or performative act. The research also sought to situate the emergence of the manifestation from the mobilization of afro-brazilian religious communities in Salvador, to face inter-religious conflicts and present a historical approach to the occupation of the area of the city where the neighbourhood is located, its insertion in the urban space of Salvador, in order to discuss interconnections between the territorial dimension, religion and black identity, through which the candomblé people present themselve in the public space as a collective political subject. To go out on the streets, its agents promote dialogue and cooperation between various religious communities in the neighbourhood and its surroundings and with this manifestation they trigger cosmological conceptions and ritual elements that are associated with the proclamation of the importance of temples in local life, the relationships between these temples in the neighbourhood and many others existing in the city and in Brazil, and articulate religious identity and ethnic-racial to continue the fight against religious hatred.